06 novembro 2008

Barack Obama e a regressão política


Vivemos o suficiente para ver um marco que será lembrado e contado em livros de história futuramente: nessa terça-feira foi eleito o primeiro presidente negro dos Estados Unidos, Barack Obama. Esse acontecimento nos mostra dois fatores importantes. 1º) a questão étnica ("racial" já é um termo não mais usado) continua sendo uma questão forte, especialmente nos EUA - pois se não fosse, o fato dele ser negro, branco, amarelo, rosa, laranja com bolinhas verdes não faria a menor diferença, e olharia-se unicamente para as suas idéias, as do partido ao qual pertence e a sua capacidade de governar o país. 2º) diferentemente do que anunciam os cientistas políticos, as pessoas ainda estão à espera de um "salvador", com aquele teor divino e imaculado que havia na Idade Média e em outros povos antigos, onde o governante era o representante terrestre da divindade, aquele com o único poder de melhorar a vida de todos, de salvar os cidadãos das misérias e turbulências diárias.

Esse pensamento da existência de um "salvador da pátria" (o nome daquela antiga novela não era por acaso) é muito claro no Brasil e na América Latina de forma geral - Lula foi eleito por essa perspectiva (e o Collor antes dele), Evo Morales idem, Hugo Chávez também é visto por esse prisma pelo povo. E acontece que isso é visto, dentro da Ciência Política, como algo retrógrado.

Retrógrado por vários motivos. Maquiavel e Hobbes quebram esse pensamento nos séculos XVI e XVII, ao transferirem o direito de um homem governar da "representação divina" (através da consangüinidade) para a capacidade de o fazer. Capacidade essa representada pela virtude do mesmo, e não pela linhagem sangüinea (a peça Henrique VI, de William Shakespeare, representa muito bem essa nova visão política). Claro que ainda tinha a questão totalitária no pensamento de ambos, mas essa mudança de perspectiva do governante contribuiu à Revolução Francesa, onde a idéia transmitida é que o governante é quem deve trabalhar para o povo, e não o contrário (pois sim, era o contrário que as pessoas achavam até então). Além disso, Maquiavel e Hobbes dão outra contribuição importantíssima: a FORÇA do Estado se transfere à(s) instituição(ões), e não passa mais a ser a pessoa do governante, pois é imprescindível que a ordem e o poder continuem depois da morte do governante. Assim sendo, se o centro for ele, o poder e a ordem morrerão com ele, coisa que não pode acontecer.

Ou seja, de forma geral, o governante não é mais o centro do Estado (e do processo eleitoral, no caso da democracia), e a importância passa a ser o fortalecimento de suas instituições. Esse fortalecimento deverá acontecer por diversos fatores, tais quais: elas oferecerem um bom serviço à população, os funcionários serem bem tratados e remunerados, com fim de vestirem, de fato, a camisa da instituição à qual pertence, não haver corrupção dentro delas, e tudo aquilo que dá forças à qualquer poder representativo.

Ora, o que percebemos com a badalação de Barack Obama por parte dos próprios americanos e, principalmente, do resto do mundo? Que ele está sendo visto como o salvador da pátria. Aquele que vai salvar a economia, que vai estabilizar um mundo cheio de problemas (que diz respeito não só aos EUA, mas à todos nós), que vai retirar as tropas americanas do Iraque e do Afeganistão suavizando, assim, o conflito na região... Obama virou sinônimo de solução de problemas.

Não que eu seja contra o Obama. Não que eu achasse que ele não fosse melhor que o McCain. Não que eu ache que ele não possa contribuir para soluções de alguns problemas... Mas que ele não irá nos salvar, ah, isso ele NÃO vai. Que ele não é tudo isso que pintam, ah, ele NÃO é.

Não precisamos (só) da mudança de Obama. Precisamos mudar a nós mesmos, cada um de nós.



Aline Silva
que não acredita na mudança nem na salvação da humanidade

3 comentários:

Anônimo disse...

Parece que a necessidade de um messias está na carga genética...
Rs

Igormovies disse...

Acredito que a carga seja cultural mesmo... Pelo que até agora pude ver e comparar, acho McCain melhor para o Brasil que o Obama, e "vamos e conversamos" um branco querendo vencer um negro nos pseudo-éticos-e-justos-tempos de hoje é desvantagem, né?

Tales Santana (e não o Igor, mas o blog tá certo)

Anônimo disse...

Hehe...foi só uma brincadeira para ilustrar o quanto o messianismo está presente desde o início da culturalização humana.
Buda, Moisés, Sócrates, Jesus, Marx, etc.